sábado, abril 12, 2008

Quando a vida é doce

Quinta feira fui a um show desses que é para ficar por séculos marcado na memória. Um momento antológico para um punhado de privilegiados. E aconteceu aqui, nessa antes árida soterópolis. 0-Açúcar-de-Chic0. Era este o nome do regalo. Três cantoras da nova safra local, gente talentosa e geniosa, mulheres de vozes e estilos muito diferentes reunidas no mesmo palco para cantar músicas do mais célebre compositor nacional, o patrimônio do cancioneiro brasileiro com seus olhos de esmeralda - Chico Buarque.

As três eram: Marie11a Santi4go, M@rci@_Castro e Manue1a_Rodrigues. Uma diva, uma malandra e uma brejeira. Mariella entrou no palco como se sua alma mal lhe coubesse no corpo e este, por sua vez, fosse grande demais para o palco. Em gestos largos e cheia de carisma, esparramou objetos, sorriu e encantou a platéia com sua voz suave e poderosa. Uma mariposa selvagem em show de ilusionismo para a platéia.

Márcia entrou com seu jeito moleque, figurino ligeiramente desconcertante por sua já marcada androginia, tinha todo(a)s nas mãos. Encarnou o espírito do jogo de cintura, com sorriso largo e arrebatou o palco mostrando que estava em casa. Manuela, por sua vez, era a menina-mulher dengosa, cheia de manha e charme, com timbre agudo e animado.

Em solos, duos e encontros triplos, as cantoras fizeram um dos mais bonitos momentos da música baiana que já vi. Apertada no teatro do (I)(C)(B)(A), uma platéia seduzida e encantada pelas letras de Chico e interpretações inspiradas das três.

O momento mais emocionante ficou nas mãos de Márcia Castro, interpretando Teresinha com uma verdade cênica cortante, tendo ao fundo a projeção de imagens de época (anos 70?) do cotidiano de prostitutas à beira da estrada. As transformações de cada verso eram registradas por Márci@ em seu rosto e sua voz, sem exageros de teatralidade, num espetáculo que transbordava de sentidos pela interação das linguagens - música, vídeo, corpo.

A direção artística do show, nas mãos de M-ar-condes_D0urad0, o papa das projeções, deu um banho. Lindíssima a composição com o sample de Abril_despedaçado em que as engrenagens de uma moenda rolam úmidas e douradas, criando uma textura dinâmica que embalava um dos trechos da performance.

0-Açúcar-de-Chic0 me deu a sensação de grande felicidade por estar no lugar certo na hora certa. Agradecia silenciosamente, com os olhos cintilantes, a oportunidade de estar ali presenciando aquela hora única.

Poucas vezes estive num espetáculo com uma proposta que resultasse tão evidente e, ao mesmo tempo, bela. Estava ali a temática - o açúcar, a cana, a cultura canavieira que está sendo analisada e debatida num simpósio que acontece aqui na Bahia - contemplada num casamento lúcido entre música, vídeo e performance das intérpretes. Êxtase estético. E olhe que agora os detalhes me escapam, está tudo registrado no fundo de meus olhos e no meu sangue, que corre mais fluido pelos vasos só de ter recebido essas emanações poéticas.

Quanto você pagaria para assistir a uma apresentação como esta? E como ficaria o seu queixo ao saber que foi gratuita? Felizmente, estava cheia e não deu para quem quis. Vimos uma platéia cheia e ávida. Ainda bem que as boas notícias se espalham.

Esta foi uma iniciativa do (I)(C)(B)(A) que contou com apoio do Govern0_do_Est4d0. Esse mesmo que tem gente por aí dizendo que não faz nada pela cultura.

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2 Comments:

At 12:34 PM, Anonymous Anônimo said...

belo texto!

Faltei ao show e sua narrativa só aumentou minha lamentação. Mariella Santiago é mesmo DIVA!

 
At 7:37 PM, Anonymous Anônimo said...

pode explicar o que significa bizarrias como "Govern0_do_Est4d0."??
versao ciborgue do miguxes?????????

 

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