quarta-feira, maio 31, 2006

Estilhaço[s]

de 30/5/2006 a 1º/7/2006
Terça/Quarta/Quinta
Teatro Moliére (Aliança Francesa)
20h
free


Muita gente tem a maior má vontade quando se fala em eventos experimentais ou de formatura de alunos dessa ou aquela escola de arte. Bom, essas pessoas precisam começar de algum lugar. E vale lembrar que a formação serve para burilar talentos, cujo crescimento vem da prática e um artista se forma dia a dia. Falta de crédito mina a arte e quem gosta mesmo da coisa (como espectador ou parte do processo) tem como prazer e obrigação estar aberto à cata do novo. Por isso, que venham os experimentais, os começos, pontos de partida!

Assistir à peça de formatura de um grupo de atores da Escola de Teatro da UFBA me deixou bastante satisfeita. Em cena, fragmentos de textos e peças curtas que abordam questões sociais e da natureza humana - autores clássicos, estrangeiros e também gente que podemos encontrar numa dessas esquinas de Salvador. Tudo duro, muito duro. Pesado, diferente do Teatro que costuma ser feito para multidões aqui na Bahia. A platéia sai da sala marcada. É impossível o pensamento passar incólume a todas as situações e emoções mostradas. São de doer na alma.

Há um desequilíbrio natural de talentos no palco, mas isso não compromete as cenas. É interessante, inclusive do ponto de vista da formação de platéia - suscita comentários, comparações, compreensão sobre o que funciona bem ou não. Uma peça com tal teor, de graça e num espaço convidativo como o Teatro Moliére é um bem público. Diante de eventos como este não dá para ficar em casa de braços cruzados reclamando que falta alternativa, que é difícil ter acesso ao novo, que é sempre mais do mesmo. Se quer conhecer e gostar de teatro, arrisque! E neste caso, é provar, como quem testa uma iguaria desconhecida.

A peça não é o supra-sumo da ousadia (e por acaso é obrigatório?), mas é competente no que faz e se destaca no cenário local pelas temáticas escolhidas - que se costuram surpreendentemente bem em sua diversidade, constituindo uma teia sólida, que não quer ser como um popular "soco no estômago", mas deixa um gosto azinhavrado na garganta. Semeia sensações e provoca (a palavra é bem essa) reflexões, sem ficar anunciando isso no press release. Ponto para eles: às vezes, o que mata é a pretensão.

Também é importante sublinhar o cuidado com o acabamento, para que não se confunda trabalho de estudantes (quer dizer, agora formados) com amadorismo. A despeito da já tão conhecida contingência econômica do teatro, eles souberam lançar mão de seus laços com a classe - adquiridos com a prática que faz parte de sua carreira iniciada antes mesmo do diploma na mão - e outras manhas de produção para realizar uma montagem de qualidade, fruto de esforços de cooperação. Válido em função das vacas magras, mas é bom ficar de olho para não perpetuar o escambo - o sistema em que vivemos, queiramos ou não, é o capitalista, não podemos esquecer disso.